Palestrante Especialista em Liderança

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Talentos desempregados

Determinação, lealdade, pró-atividade, transparência e comprometimento com a empresa. Márcio não pode ouvir ninguém falando mal de seus superiores ou de sua empresa, logo sai em defesa. Seus princípios e valores são moldados pelos princípios e valores organizacionais. Por Marcos Hashimoto

Por Marcos Hashimoto

Márcio é um destes profissionais que podemos chamar de ‘exemplares’. Altamente disciplinado e organizado, é extremamente competente no que faz, bem relacionado entre pares e subordinados, conhece muito bem seu trabalho, constrói estratégias vencedoras que sempre trazem resultados positivos para a empresa onde trabalha. Como se isso não bastasse, possui ainda qualificações que todo gestor procura em sua equipe: Determinação, lealdade, pró-atividade, transparência e comprometimento com a empresa. Márcio não pode ouvir ninguém falando mal de seus superiores ou de sua empresa, logo sai em defesa. Seus princípios e valores são moldados pelos princípios e valores organizacionais. Apóia todos os empreendimentos e projetos iniciados pela alta direção, procura se envolver e se colocar à disposição, com seu talento e habilidades. Acredita fortemente que, se sua empresa cresce, ele cresce também. Baseia todo e qualquer trabalho numa única palavra: Confiança. Ele crê piamente que confiança gera confiança e quando ela é mútua, a produtividade aumenta tanto quanto a qualidade e a motivação intrínseca.

Só que Márcio não é perfeito. Ele só tem um defeito: É empreendedor. Ora, direis vós, como pode isso ser um defeito? Não é justamente a qualidade que todas as empresas estão procurando, talentos com perfil empreendedor? Que seja pró-ativo, inovador, independente, focado em resultados, agindo com iniciativa própria e dedicando-se a um negócio como se fosse dele? Sim, de fato, só que, apesar de todas as empresas saberem que precisam deste tipo de talento, são poucas que estão preparadas para absorvê-lo.

Douglas McGregor definiu em 1972, o que ele chama de estilos de administração, que convencionou chamar de Teoria X e Teoria Y. Segundo seus estudos, a Teoria X explica um estilo de administração tradicional, mecanicista e autocrática em que seus praticantes exercem o poder autoritariamente, com controles rígidos e dentro de padrões planejados e organizados, pois parte do pressuposto que todos os funcionários são indolentes, egocêntricos, preguiçosos, sem ambição, que não gostam de assumir responsabilidades e resistem às mudanças. Já os líderes da Teoria Y baseiam-se em concepções modernas sobre a natureza humana, em que o trabalho é inerentemente prazeroso, o funcionário aceita e busca responsabilidade, gosta de ambientes flexíveis e dinâmicos e é auto-motivado.

O chefe de Márcio vem se sentindo incomodado com algumas atitudes de seu subordinado. Toma decisões sem sua participação, gera iniciativas sem consultá-lo, faz observações que questionam o status quo, defende até os mesmos valores que ele, mas com um empenho e determinação que chega a assustá-lo. O chefe de Márcio sente-se mais confortável com pessoas que tenham idéias, mas sempre as submetam à sua aprovação; que tenham autonomia, mas não tomem nenhuma ação sem envolvê-lo; que façam críticas, mas respeitando sua opinião. A despeito da eficácia e dos resultados que o trabalho de Márcio gera, a dificuldade do gerente X em coordenar o funcionário Y vai acabar em tragédia.

Márcio ainda não sabe, mas será despedido. Os alegados motivos de incompatibilidade de estilos não o convencerão e a rejeição não será bem aceita por ele. Um misto de confusão e incredulidade se apossarão de seus pensamentos. Reverá todo o seu trabalho em busca de falhas e não achará. Repassará seus princípios e valores em busca de inconsistências e não encontrará. Consultará colegas e amigos em busca de respostas que não virão. Seus sentimentos se chocarão com a realidade dura e crua. A decepção, a frustração e a desilusão se juntarão à agonia do rótulo de ‘desempregado’ e ‘perdedor’.

Que palavras podemos dirigir a Márcio nesta hora tão difícil? A principal dica que eu daria é: Não perca, neste frágil momento, aquilo que é tão raro nas pessoas hoje. Não abra mão de seus valores, princípios e convicções. Não perca a auto-estima e a confiança em si. Não abandone a pró-atividade e a coragem de criticar. Não é porque alguém não soube valorizá-lo que você deve mudar. Resista à tentação do sistema pasteurizá-lo. Lute para manter-se leal ao caminho que escolheu, por mais difícil que pareça trilhá-lo. As empresas precisam de pessoas como você e é apenas uma questão de tempo achar alguma que já tenha escapado da mera retórica do empreendedorismo corporativo. Tenha paciência e você será recompensado. Felizmente o número de gerentes Y está crescendo. Só não deixe de continuar procurando o seu espaço.

Marcos Hashimoto é consultor, escritor e palestrante, professor e coordenador do Centro de Empreendedorismo do Insper (ex-Ibmec São Paulo) e Doutor em Administração de Empresas pela EAESP/FGV.

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Site: www.marcoshashimoto.com



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